quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Tecla SAP

Essa é para mim a magia das línguas...

Estávamos em onze pessoas, e na sala ao lado uma mulher falava alto. A voz era clara mesmo separados pela parede. Todos escutávamos a mesma coisa, no entanto, eu era a única que conseguia compreender o que a voz dizia. Meu cérebro era o único a dar significado às palavras, a decodificá-las.

A mulher falava em português. Eu era a única brasileira na sala.

Todos nós temos o mesmo vocabulário em nossas línguas. Palavras. Significados. Verbos, substantivos, adjetivos, advérbios. Objetos, cores, dias da semana, meses. É no modo que movemos os lábios, movemos a língua, puxamos o som da garganta... Pronunciamos. E pronto! O resultado pode ser absolutamente irreconhecível.

É quase como se o ouvido fosse treinado. Num dia, o que você ouve é só uma sequência de sons desconhecidos. E depois de estudar, o ouvido converte o barulho em linguagem. É apertar a tecla SAP na mente.

Uma das metas na minha vida - porque isso exige tempo e esforço absurdos - é conseguir treinar meu ouvido em pelo menos três línguas diferentes. Viajar pelo mundo, entender e ser entendida.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Além da capa


Eu e todas as amigas brasileiras que tenho aqui temos poucas semelhanças. Somos e fazemos partes de diferentes grupos sociais. Diferimos em gostos, culturas, costumes, gírias, personalidades, humor e, principalmente, Estados. Só nos conhecemos porque - por várias razões - compartilhamos o mesmo desejo de morar fora.

O destino fez com que nos conhecessemos em outro país, porque de maneira nenhuma nossos caminhos se encontrariam no Brasil. E mesmo que, por uma ventura do acaso, nos esbarrassemos por lá, não passaríamos das primeiras impressões, tão acostumadas estamos em julgar o livro pela capa. Buscamos semelhanças nas possíveis novas amigas, e dificilmente fugimos do conhecido, do seguro.

Estando em outro país, no entanto, as opções são limitadas e somos forçadas a superar as primeiras impressões. Não estou dizendo que sou obrigada a tolerar as amizades que conquistei aqui, ou que elas são obrigadas a me aturar. Pelo contrário, não só aprendemos a aceitar as nossas diferenças, como passamos a achá-las fatores de unicidade. São elas que tornam as meninas que conheci aqui tão especiais.

E esse é um dos meus principais aprendizados adquiridos na experiência de ser au pair.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Sete meses

Completo hoje sete meses nos EUA. E o menino mais velho que eu cuido completa hoje cinco anos de vida. É emocionante o quanto se presencia no crescimento de uma criança em poucos meses. Ele sabe escrever agora e me enche de orgulho. Foram horas copiosamente, tarde após tarde, praticando letras juntos na mesa da cozinha. Eu estava lá, no ponto de ônibus, esperando com ele no primeiro dia do prézinho. Ele entrou, foi e voltou sozinho que nem gente grande.

O mais novo tem três anos. Idadezinha complicada. Cheia de "conquistas", no entanto. Eu o vi aprender a nadar, a usar a privada (e, graças ao bom Pai, não precisar mais de fraldas), a escrever o próprio nome (esse por mérito exclusivamente meu), ir ao primeiro dia de aula na vida dele.

Já vi o gosto dessas crianças mudar a cada mês, em relação a brincadeira, comida, medo, filmes, amigos... E até o fim da minha estadia, vou presenciar mais umas centenas de mudanças. E apesar de soar exagero, as vezes, eu sinto amor de mãe (ou talvez de irmã mais velha) por esses meninos. São nove horas diárias de convívio como au pair - e o resto das horas como membro da família. E querendo ou não, pra se realizar um bom trabalho é necessário se passar por mãe e cuidar deles como filhos. Com o carinho e broncas e proteção e castigos e incentivos. Tudo no seu devido momento. E, sem falsa modéstia, I am a hell of a good au pair!

A maioria de meninas au pairs que conheço diz que, depois dessa experiência, começaram a pensar seriamente se querem ou não ter filhos. Eu tenho certeza que sim.

Estudos

Finalmente, comecei a estudar. Nunca pensei que os estudos seriam um dos meus maiores problemas aqui, mas, aparentemente, ter o inglês bom limita as opções. Entende-se como quase fato que au pair vem para os EUA com o objetivo de aprender inglês, e não aperfeiçoá-lo. De qualquer forma, minha intenção inicial era, sim, estudar inglês. Quando cheguei aqui, no entanto, tanto meus pais americanos quanto a minha counselor me disseram que seria perda de tempo. As aulas de "inglês como segunda língua" que praticamente toda au pair da região frequenta, infelizmente (e isso é unanimidade), não são boas.

Foi uma batalha para conciliar preço, horário, créditos (aqueles que toda au pair tem obrigação de estudar durante o ano e não é qualquer escola/curso que conta) e, a parte mais difícil, algo que me interessasse. Não há muitos cursos em comunicação na região, e as universidades que os têm são absurdamente caras. Para agravar, a counselor, que supostamente está aqui para nos dar auxílio, não foi de muita ajuda. No final das contas, decidi satisfazer um dos meus interesses particulares/profissionais e comecei hoje um curso de intérprete, Spoken Language Interpreter. As aulas, entretanto, não valerão créditos, o que significa que eu ainda preciso preenche-los de alguma forma que eu ainda estou trabalhando para resolver.

Mudaram as estações

De qualquer forma, tive um verão incrível - que infelizmente acabou ontem. Agora é começar a se preparar para o frio.

domingo, 12 de setembro de 2010

Gaga Uh Lala


Vi a Lady Gaga pela primeira vez no dia 13 de julho de 2008, apresentando ao vivo a música "Just Dance" no concurso Miss Universo. Lembro-me de pensar "Que doida é essa?" com aquela calça colada, blusa amarela berrante com ombreiras. Toda plastificada. Mas também me lembro de A-DO-RAR a música (até hoje a minha preferida dela). Pouquíssimo tempo depois, assistindo no youtube, ao, na época, lançamento das Pussycat Dolls "I Hate This Part", achei sem querer o vídeo da cantora que estava abrindo os shows da turnê delas: "Just Dance", da Lady gaga. Levei alguns minutos pra me lembrar de onde conhecia aquela música.

A partir daquele momento, viciei. Procurei vídeos com outras músicas e letras dela. No mesmo dia, ouvi "Love Game", "Poker Face", "Paparazzi" e "Beautiful Dirty Rich". Gostei de todas. Consequentemente, baixei o álbum "The Fame". Em uma semana o sabia todo de cor e salteado. Assisti a todos os episódeos do canal dela no youtube, enquanto ainda tentava se divulgar e ganhar espaço na mídia, fazendo showzinhos em clubs. Posso dizer que sou fã da Gaga antes da fama monstro.

Ela significou a quebra de um dos meus preconceitos: mulheres na música (um tanto contraditório de minha parte, pra quem tocou bateria por quatro anos). Depois dela, passei a ouvir PCD e Paramore - sem o pensamento machista de que mulher em bandas é tudo poser.

Eu sei que muito do que se atribui à Gaga se atribui a outros grandes nomes da música - como à Madonna. A receita não é inédita. No entanto, ela se encaixa no que pode se classificar na categoria "artista". O pacote completo. Ela é cantora, escreve as próprias músicas, é estilista das próprias roupas... As letras das músicas delas são tão pessoais e transparentes que chega a ser constrangedor, invasivo ouvi-las. Confissões descaradas sobre a obsessão pela fama, dinheiro e sexualidade. Até mesmo nas letras mais bobas como a de "Boys Boys Boys", acerta na medida perfeita na futilidade.

Lady Gaga é um dos melhores exemplos da força d'O Segredo: quando se acredita em algo com todo o coração, um dia, vai se realizar. Ela simplesmente queria ser star. É prova também de que quem tem talento, não desiste dos sonhos, acredita no próprio potencial e sabe se promover vai acabar sendo famoso. Um monte de clichê, eu sei. Mas é assim que eu a enxergo.

Essa visão só se fortificou depois de assistir ao show, em Charlottesville, VA. Além de ser uma mega produção, diferente de qualquer um que eu já tenha assistido (só não perde pra U2, é claro), a Gaga é uma front woman fantástica. É emocionante ve-la onde está hoje. Nasceu para estar em um palco. Ela pergunta durante o show para a platéia: "Do you think I'm sexy?" e emenda dizendo que nem sempre ela foi popular, que sofria bullying na escola. É sincero a emoção dela de ter conseguido atingir a posição em que está e ver a ovação dos fãs. E os fãs são um show a parte, fantasiados de Lady Gaga.


Uma das músicas do repertório é uma inédita do CD que está pra ser lançado, "You and I". Depois de ouvi-la ao vivo, eu só tenho a dizer que estou na espera ansiosa pela próxima bizarrice de Lady Gaga, por que ela é capaz de muito mais e "she's not going anywhere".

domingo, 5 de setembro de 2010

Dame mas gasolina!


Frentista é uma profissão inexistente nos EUA. Você coloca gasolina no seu próprio carro. É só passar o cartão de crédito, esperar a bomba ser liberada e começar a abastecer. E pronto, tanque cheio. Se tiver de pagar com dinheiro é só pedir para o atendente da loja de conveniência liberar a bomba pra você. Parece super simples - e é -, mas desastrada que sou, precisei de ajuda nas duas primeiras vezes que abasteci meu carro.

E como vai dinheiro em gasolina... O preço do combustível regular varia entre $2,44 e $2,80. E foi em busca desse valor mais baixo que eu e uma amiga, Vivi, paramos num posto na cidade vizinha hoje. Saí do carro, passei meu cartão e de repente me assustei com um barulho alto. O homem abastacendo ao lado esqueceu de retirar a bomba do carro e arrebentou a máquina. Ia levando a bomba com ele.

Eu falei alto, em português, para Vivi o que tinha acontecido e rimos. No intervalo do homem entrar na loja de convenência e voltar com um funcionário para ajudá-lo, eu paguei pela risada. Quando acabei de abastecer, tirei a bomba do carro, mas o gatilho enroscou e o combustível continuou a sair. Tomei um banho de gasolina e não conseguia desenroscar o negócio. Gritei pra Vivi me ajudar e na hora do desespero, saiu "socorro" ao invés de "help". Até que uma alma bondosa, um senhor que tinha acabado de estacionar, veio me ajudar e fez a gasolina parar de vazar - esguichar seria a palavra mais correta. E a pior parte é que paguei pelo combustível desperdiçado.

Quando o homem voltou com o funcionário do posto, o chão estava lavado de gasolina e foi a vez dele de rir. E aposto que pensamos a mesma coisa: "Ainda bem que outro atrapalhado me ajudou a não passar tanto ridículo".


Só rindo...


PS: A foto é uma típica de au pair, nas primeiras vezes abastecendo o próprio carro.